Sejam bem-vindos e bem-vindas a mais uma news do Clima.
A curadoria mensal de conteúdos, divagações e cutucos pra gente não desistir e se interessar mais pelo que acontece fora do nosso umbigo.
Nessa edição: reflexões sobre a nossa suposta independência, agenda de encontros gratuitos e referências para botar os neurônios pra trabalhar. Espere esse gif carregar pq ele é muito bom:
Ah, as palavras em laranja são clicáveis, sempre bom avisar.
Pra quem cansou da gente, é possível se desinscrever a qualquer momento lá embaixo.
Para quem curtiu, espalhe a ideia :)
Você já parou para pensar de que nenhum sucesso ou conquista na nossa vida acontece apenas por mérito próprio?
A gente adora histórias de superação e valoriza pessoas “esforçadas”, ou mesmo sentimos orgulho ao olhar pra nossa trajetória e ver que conquistamos muito ralando pra caramba, então acaba sendo bem comum deixar de considerar que não fazemos nada sozinhas/os.
Mesmo que você tenha se ferrado muito pra chegar onde chegou, alguém te pariu, te educou, te disse sim para um trabalho ou uma oportunidade, te validou, te escutou ou deu sentido a sua existência. Mesmo que você seja uma pessoa que se considere uma sobrevivente, não tem como estarmos vivos/as sem assumir que dependemos sim dos outros para tal, e isso não é algo ruim.
Em abril lembro de ler esse tweet e simpatizar/entender essa perspectiva, ao mesmo tempo em que bateu um leve desespero.
Porque tem algo sobre a nossa individualidade que não podemos descartar: sobre tornar-se adulto, emancipar-se e conquistar autonomia. Quando pensamos por exemplos em nossas vidas como mulheres, há uma importância histórica gigante em não depender financeiramente e emocionalmente de homens, em poder sair sozinha, na conquista de direitos que lhe dêem autonomia pros corpos quando olhamos pro ainda bem ativo patriarcado. E nessa jornada, tem um lugar que sim só depende de nós, e que crescer se dá nesse enfrentamento de nossos medos, incoerências e perrengues que a vida nos taca na cara.
Parece contraditório afirmar que independência é importante e problemática ao mesmo tempo, mas acredito que são lugares bem diferentes que se cruzam.
Alguns dias antes, a Mônica Gurjão tinha soltado esse post aqui:
O ideal do self-made-man (algo como homem que se faz pelo próprio mérito), propagada pelos EUA e sua cultura empreendedora, colaborou para esse imaginário de que sucesso é não depender de ninguém e alcançar o topo passando por cima do que for necessário.
Ideal perfeito já que vivemos um sistema no qual a competição faz parte do seu funcionamento. Ou seja, precisamos de reconhecimento a todo momento que nos mostre o quanto somos melhores que os outros e ainda sentir o prazer e orgulho em falar: não precisei da ajuda de ninguém.
E quando vemos o quão injustas são as coisas por aqui, no qual um monte de gente acomodada vive tranquilamente e sem esforço, eu quero mais é que me valorizem pela minha disciplina e performance, certo?
O que quero lançar é: será que a normalização dessa ideia, alegando que isso é da “natureza humana” não é só mais uma artimanha que colabora diretamente para a naturalização e manutenção das desigualdades?
O quanto muitos de nossos sofrimentos hoje provém dessa versão individualista e fatalista que diz que é cada um por si?
Não nos bastamos, e assumir essa suposta fragilidade pode transformar a maneira com a qual lidamos com o mundo e com nós mesmos/as, tal como reflete a legenda desse post da Juliana Camará:
Interdependência é entender que todos os seres desse planeta aqui estão conectados e que precisamos uns dos outros para sobreviver.
Aqui estamos falando de redes de apoio, de regeneração de laços comunitários e entender que contar com o outro pode ser revolucionário.
E por fim, enquanto escrevia essa news, a Rafa Arradi do Desencaixe soltou essa:
O “nois por nois” pode ser entendido como uma necessidade de união de quem é marginalizado, uma vez que não como depender ou contar com o poder dominante.
Mas se for interpretado a nível individual, pode levar ao mesmo discurso meritocrático que está empurrando todo mundo pro abismo.
Onde é que você sente que pode contar com as pessoas e também não dar conta de tudo?
Você tem sustentado essa versão da história que é melhor se virar sozinha/o?
Como podemos transformar a maneira com a qual interpretamos a dependência e a confiança nos outros como algo positivo em seu equilíbrio?
Perguntas complexas que não têm resposta fácil. Mas chega junto que um dos encontros do Clima (lembrando que são gratuitos) vai jogar uma luz sobre tudo isso.
Agosto vai ser bem agitado por aqui: no dia 16 de agosto, terça-feira, vamos conversar com a Kurai sobre a relação entre psicodélicos, saúde mental e espiritualidade, com um olhar crítico que vá além do clichê do jovem místico.
E no dia 29 de agosto, segunda-feira, falaremos com o Lucas Veiga sobre a importância da comunidade e de redes de apoio coletivas quando pensamos nas soluções para os nossos sofrimentos que derivam dos problemas sociais que estamos enfrentando.
Aqui uma pequena descrição de cada um:
Kurai: Indígena Pampeana, acadêmica de enfermagem na Universidade Federal de Pelotas (UFPel), estuda sobre saúde mental, saúde coletiva e o uso psicodélicos no tratamento e atenuação dos sintomas da depressão e outros sofrimentos psíquicos. Integrante da Coletiva de Mulheres que Ouvem Vozes (CMOV) e Associação Psicodélica do Brasil (APB) - Núcleo Sul.
Lucas Veiga: psicólogo e mestre em Psicologia Clínica pela Universidade Federal Fluminense. Idealizador da plataforma descolonizando.com que reúne textos, vídeos e cursos ministrados por ele sobre saúde mental, questões raciais e anticoloniais. Além do trabalho como pesquisador e professor, e dos atendimentos clínicos, atua também como palestrante e consultor de saúde mental. É autor do livro Clínica do impossível: linhas de fuga e de cura.
E como sempre falamos que não queremos encher a caixa de vocês, não iremos avisar novamente por email, somente pelo insta e pela comunidade. Então já aproveito para enviar o link do encontro com a Kurai aqui, e o link do encontro do Lucas fica pra news do mês que vem.
→ Só se fala na Casa Abandonada e a famigerada mulher. Mas vimos a proporção que o negócio tomou e como toda barbárie se torna espectáculo (nenhuma novidade). Algumas críticas bem válidas cutucam a gente onde menos queremos: vale ler esse post aqui e fiquei pensando sobre essas ponderações aqui.
→ Ainda não vi mas quero ver essa série nova da Netflix sobre psicodélicos, Como Mudar a sua Mente. Apesar de curtir a perspectiva do Michael Pollan sobre alimentação, algo me diz que vai ter uma pegada um tanto alienada das questões sociais e até pelo título, parece que individualiza os problemas e promete soluções de “cura” através de substâncias. A ver, que vai ser material pra gente polemizar no encontro com a Kurai.
→ Pensando em vínculos de solidariedade num âmbito político, vale ver esse vídeo da pensadora Jodi Dean sobre camaradagem, principalmente a crítica que ela faz sobre o conceito de “aliados” nas lutas e o quanto isso pode imobilizar, desagregar e ser um empoderamento de direita no fim das contas, que se baseia no medo e no cancelamento. Aqui não é sobre diminuir as especificidades de cada luta, que devem ser consideradas e respeitadas, mas sim entender que elas tem uma raiz em comum.
→ E pensando em cancelamento, lembrei desse texto do Mark Fisher “Deixando o Castelo Vampiro” que pensa sobre a necessidade de excluir, sentir-se superior e que termina em isolamento e culpa.
Hoje não vai ter aleatoriedades porque parece que cheguei no limite de tamanho de news que o Substack recomenda.
Até o mês que vem :)
Abraços,
Nat
Aaaa amei ❤️ q honra aparecer aqui hehe valeu nat! Eu vi vc falando desse doc de mudar a mente e fiquei mt surpresa q é de psicodélicos, pq quando vi na netflix já virei os olhos e falei "ctz q é de MUDAR O MINDSET, REPROGRAMAR O DNA, CRENÇAS LIMITANTES etc" kkkk nem li a sinopse. N sei se puseram um péssimo título ou realmente vai seguir uma linha assim #medo
Amei as referências... Todas as abas abertas e a certeza de que daqui 20 min sairei uma pessoa melhor.
Obrigada