Sejam bem-vindos e bem-vindas a mais uma news do Clima.
A curadoria mensal de conteúdos, divagações e cutucos pra gente não desistir e se interessar mais pelo que acontece fora do nosso umbigo.
Nessa edição: sobre o último encontro do Clima do ano, superioridades e egocentrismos + refs pra ver sem pressa.
Ah, as palavras em laranja têm coisa, só clicar.
Pra quem cansou da gente, é possível se desinscrever a qualquer momento lá embaixo.
Para quem curtiu, espalhe a ideia :)
Começamos aqui com uma boa notícia: teremos mais um encontro aberto do Clima, o último do ano, pra falar sobre um tema bem espinhoso e que muita gente acha que já foi falado o bastante, quando na real só estamos na pontinha do iceberg.
No dia 07 de dezembro, uma quarta-feira, vamos trocar uma ideia com a Izabel Accioly, a @afroantropologa, e com a Geísa Mattos, professora de Sociologia (Universidade Federal do Ceará) pra conversar sobre alguns pontos dentro das questões raciais que vêm ganhando espaço nos últimos tempos: existe antirracismo fora de novembro? Como podemos ir além da discussão básica sobre privilégio branco e não transformar o tema em uma lista de boas práticas que servem apenas para livrar a nossa consciência?
Por vivermos em um país no qual acreditou-se até pouco tempo ser fundado sob uma tal de democracia racial, é difícil até hoje jogar a real sem que se leve pro pessoal ou fugir da crença que racismo é uma questão apenas de pessoas “más”.
Mas chega junto, o encontro será online e aberto para todo mundo e a ideia é justamente criar um espaço para podermos conversar sobre esse tema-tabu longe das tretas das redes sociais e olhar no olho na hora de encarar a profundidade do buraco.
Como não vai ter outra news até lá, você já pode salvar o link do encontro ou também já marcar na sua agenda clicando no botão abaixo :)
Já pegando uma espécie de gancho sobre esse encontro: as eleições passaram e o pior não se concretizou - mas já tá bem explícito o quanto não vai rolar baixar a guarda e voltar pra uma passividade achando que tudo está resolvido.
Dentro desse caldeirão de problemas coletivos que estamos enfiadas/os, vale falar sobre um ponto bem básico, que no caso se refere à vida privada: as relações.
Sim, relações também são políticas e nos últimos anos vimos diversos rompimentos e desavenças entre pessoas que se gostavam mas que de um mês para o outro passaram a se detestar a ponto de realmente cortar o contato totalmente.
No começo de novembro, rolou uma pergunta nos stories que remetia ao fato de muita gente não reconhecer mais pessoas que se fanatizaram e parecem viver em uma realidade paralela, rompendo laços afetivos e brigando com geral.
A resposta me pegou demais, e mesmo que enviezada (pode ser que só quem passou por isso sente vontade de responder a enquete), quase 1000 pessoas clicaram no sim.
Isso diz muito sobre uma ruptura que não vai ser fácil de tratar. Há diversas teorias, livros, filmes, matérias que tentam explicar esse fenômeno que não é de hoje, mas que a cada época se manifesta de um novo jeito. Esse fio aqui do Twitter resume de forma interessante pra quem quiser começar a pensar sobre, e tanto lá quanto nos comentários dá pra pegar várias referências para se aprofundar. Nos destaques do insta do Clima também dá pra encontrar alguns materiais.
Mas pra além dessas eleições, já sabemos o papel das redes sociais em jogar as pessoas para extremos, polarizar e se capitalizar em cima da nossa raiva e indignação.
E observando algumas atitudes ao redor, como também lendo bastante sobre, é possível perceber que existem sim um tipo de soberba por parte de uma parcela das pessoas consideradas de esquerda/progressistas frente a outras que possuem valores não tão….nobres (pra gente).
Afinal, olhar gente rica/branca bradando contra a existência de certos grupos minorizados, querendo golpe de estado e apoiando um fascínora, gera uma repulsa instantânea. Mas acontece que essa é só uma face desse reacionarismo, e o grupo é muito mais heterogêneo do que pensamos.
Então talvez nos cabe entender que existe algo mais profundo, que muitas vezes não é apenas preconceito ou ódio enrustido, mas sim uma falta de sentido que a nossa sociedade proporciona e uma falta de pertencimento e conexão inerente à subjetividade neoliberal que faz com que esse movimento seja um refúgio àqueles que, por diversos motivos, não conseguem pertencer e se sentem inferiorizados ou ressentidos.
Naturalmente queremos ser pessoas boas e acreditamos que temos valores coerentes com nossas atitudes, dentre eles justiça social, fim das opressões/desigualdades, compaixão, entre outras pautas que são bem óbvias e urgentes, portanto inevitáveis da gente apoiar. Mas, entre se identificar com essas pautas e a nossa forma de agir, há muitas vezes um abismo.
E na direita surgem reações contra a “cultura woke”, contra o “politicamente correto” e o que eles chamam de “identitarismo”, tudo entre aspas mesmo porque essas palavras têm um uso e significado próprio de acordo com quem está falando nesses casos. Mas o que conecta elas é um repúdio a um policiamento individual e público voltado a moral, que tem como objetivo cancelar quem não segue os comportamentos e regras do grupo, que diversas vezes, dizem mais respeito a como se portar do que uma crítica estrutural do sistema em si.
Sei que parece contraditório porque é justamente o que vemos do lado de lá, e não é sobre passar a mão na cabeça dessas pessoas, porque várias delas estão provocando sofrimento real nos outros de forma muito injusta.
Mas o que gostaria de propor aqui é uma tentativa de não generalização.
Como podemos, pelo menos nas relações próximas com aquelas pessoas que eram legais e amorosas e que se tornaram fanáticas, tentar estabelecer vínculos e entender as motivações que existem por trás?
Acabo segmentando dessa forma porque há aquelas que já tinham pretensões fascistas e preconceituosas e não tem jeito mesmo, só encontraram a vazão pra isso agora.
Diferenciando aqueles que nunca tiveram seu poder e privilégio colocados em cheque e que agora que se sentem ameaçados e por isso reagem, podemos pensar em como conectar com as outras pessoas que não pertencem a esse grupo, entendendo que elas têm capacidade de pensar criticamente se estimuladas e também de criar relações de respeito mútuo.
É importante demais aqui não nos enxergar como donas/os da razão e nem salvadoras/os dessas pessoas (porque é aí que reside a arrogância). É uma vontade genuína de entender o que pega de verdade, sabendo que ninguém nasce pronto e qualquer um/a de nós pode cair nas graças da idolatria, ignorância e auto-engano dependendo das circunstâncias.
Acredito que vale mais encontrarmos juntos/as quem é realmente o inimigo - e nesse caso é olhar para quais pessoas/instituições/corporações se beneficiam dessas tretas, da desigualdade, da dissonância cognitiva e que seguem aí ano após ano enquanto a gente se mata aqui embaixo.
Se você é uma dessas pessoas que se sente julgada e tem ranço de pautas progressistas, responde aqui contando um pouco. Sigilo total :)
→ O documentário recém lançado pela Netflix sobre os Racionais MCs, Racionais: Das Ruas de São Paulo Pro Mundo, é uma aula de resistência na prática e mesmo que você não curta o som, veja para entender o que tanto se fala sobre classe, raça e tbm gênero pela perspectiva de um dos grupos mais importantes que tem por aqui.
→ Desculpe te Incomodar: o filme não é novo, mas só vi por agora e mostra de forma irônica e bem humorada a tragédia de trabalhadores de um call center, e como ter sucesso nesse mundo hostil.
→ Podcast projeto Querino: o ótimo material apresentado pelo jornalista Tiago Rogero mostra a versão da história do Brasil que não aprendemos na escola, tendo pessoas negras como personagens centrais da narrativa. É bizarro o quão pouco sabemos sobre acontecimentos essenciais.
Pra fechar por aqui, quem participou de alguma edição do Clima Online vai lembrar da Aldren. Ela lançou recentemente o financiamento coletivo de seu projeto De Quantas Pessoas Negras Você Comprou Hoje, que pretende dar continuidade e ampliar o trabalho que ela já faz pela mais afro de curadoria de profissionais negros/as, bolsas de estudo e treinamentos de diversidade.
A verba vai servir para construir uma plataforma online que vai facilitar a conexão entre pessoas, negócios, oportunidades e educação.
Conheça mais sobre o projeto, as recompensas e contribua aqui :)
Nos vemos no dia 07 de dezembro, e que aqui continue sendo uma porta aberta pra gente conversar sobre o que menos queremos conversar.
Um abraço,
Nat
Amo seu jeito de escrever empático Nat, e as referências tb.... Obrigada